
Mayday, mayday. Estou numa cidade sitiada. Estocolmo está cercada de navios de guerra, com tropas nas ruas. Soldados e policiais em todas as esquinas. Não consigo entrar nem sair do meu hotel. Socorro.
Já achei que tinha alguma coisa errada quando entrei no avião vindo de Oslo. As duas primeiras filas do avião, de classe única, estavam vazias. Os três primeiros compartimentos de bagagem dos dois lados estavam vazios e sem poder serem usados. Quando estava na hora de partirmos, entrou um segurança, daqueles de filme, com aquele negócio na orelha e radinho na mão. Cinco minutos depois entrou mais um, olhando suspeitosamente todos nós, os cidadãos comuns, que pagamos nossas passagens com o dinheiro conseguido com os nossos trabalhos. Ai começou a chegar uma loira com cara de secretária, um escandinavo com cara de secretário, com uma sacolinha do Duty-Free, um militar todo fardado para finalmente entrarem um casal, ele barbudo, com uma criancinha. Se sentaram, levantamos vôo. Tentei ir no banheiro (eu estava na quarta fileira) e me mandaram para o fundo do avião. A aeromoça que estava com uma cara de idiota, deslumbrada, esqueceu de nos oferecer bebidas. Ao chegarmos a Estocolmo foram levados por uma porta antes do tubo de desembarque a um carro que os estava esperando.
Passamos a alfândega, pegamos o carro do hotel que estava nos esperando e fomos para o Grand Hotel. Lá chegando começou a confusão. A rua estava com cordão de isolamento, com policiais impedindo as pessoas de passar na calçada em frente do hotel. Aquela multidão de basbaques esperando para ver alguma coisa e um monte de "paparazzi". O hall do hotel estava cheio de seguranças. Fizemos o check-in e fomos para o nosso quarto, no fim do hotel, quase no prédio vizinho.
Saímos e fomos passear ali por perto. Vimos soldados e policiais por todo lado e uma multidão indo daqui para ali e de lá pra cá. Passeamos pela cidade velha. Quisemos visitar uma igreja e não pudemos. Mas o passeio foi muito agradável.
Chegamos cansados ao hotel e não pudemos nem chegar na porta de entrada. Uma moça policial, aliás muito simpática teve que pedir autorização pelo rádio para nos deixar passar. O hall do hotel lotado de seguranças e militares fardados.
Chegamos no quarto. Logo em seguida minha mulher, a Clarissa, foi fazer compras com o Pedro-Paulo, nosso filho e eu comecei a encher a banheira. Quando a banheira estava pela metade, eu tentei entrar. Coloquei o primeiro pé e pumba, escorreguei e cai de cara dentro da banheira. Batí o joelho, o ombro e as costelas do lado esquerdo.
Então aqui estou, todo encarangado, numa cidade cercada de navios de guerra e lotada de seguranças, policiais e soldados.
Tétrico não?
Pois não é não.
A manhã vai ser o casamento da princesa Victória, herdeira da corôa suéca, com o dono de uma rede de academias de ginástica.
No nosso avião vieram membros da família real norueguesa (de avião de carreira viu Lula, classe econômica).
No nosso hotel estão cabeças coroadas da Jodânia, do Japão, membros das famílias reais da Holanda, da Noruega, da Bélgica, da Dinamarca e da Islândia.
Para todo este carnaval, até que a segurança não nos incomodou até agora. Todo mundo é muito gentil. Os policiais conversam gentilmente com as pessoas, respondem às perguntas que são feitas com toda a atenção. Os militares mal se vêem. Os navios de guerra fazem um cordão de isolamento dos lugares em que a Família Real vai receber todos os outros convidados coroados. Civilizadamente.
É tudo muito bonito isso de Famílias Reais, "The Royals" como se diz em inglês. Mas o simples fato de uma pessoa ser considerada melhor do que as outras em virtude de seu nascimento não me desce. São pessoas educadas para a função que exercem, que não fazem gafes, não bebem em público, não falam besteira e sabem se vestir para todas as ocasiões.
Mas eu prefiro você, viu Lula. Prefiro o sistema em que um cidadão com pouca escolaridade, ex-pau-de-arara, ex-trabalhador de fábrica e com uma aparência de pedreiro pode chegar ao cargo máximo da país por esforço próprio e não por nascimento privilegiado.
Por isso, por mim Lula pode fazer o que você faz. Você mereceu chegar aonde chegou. Eu não votei em você nas duas eleições que você ganhou e não vou votar na sua indicada porque tenho medo de guerrilheiros e não gosto de gente violenta, mesmo que essa violência tenha sido coisa do passado. Mas me orgulho muito de você poder ter sido eleito. Isso é democracia. O resto é bobagem.